O PAPEL DO LEIGO NA POLÍTICA
O PAPEL DO LEIGO NA POLÍTICA
O papel do leigo na política
Alexandre Cavalcante
Nossa Igreja ensina que para vivermos uma fé autêntica não podemos separar a fé da vida. A cruz de Cristo tem duas dimensões: a vertical, que é a transcendente, e a horizontal, que é a imanente, que nos leva a ter um compromisso radical com cada irmão que padece ao nosso lado. A caridade de Cristo nos impele a tomar uma atitude que resulte em um bem maior para todo o povo de Deus. Não podemos assumir diante dos acontecimentos e injustiças que nos cercam uma atitude passiva como se nada tivesse a ver conosco. A evangelização e formação cristã na sua dimensão mais ampla são, com certeza, formas de influenciar positivamente as pessoas que nos cercam; mas, como homens e mulheres de Deus, inseridos em uma sociedade, a Igreja nos chama a responder ativamente com nosso testemunho e trabalho no sentido da correção das injustiças e na construção de um mundo novo. É aí que a política pode exercer um papel fundamental.
“A fé cristã não despreza a atividade política; pelo contrário, a valoriza e a tem em alta estima” (Puebla, 514). O episcopado latino-americano considera que é dever da Igreja estar presente na política, “porque o cristianismo deve evangelizar a totalidade da existência humana, inclusive a dimensão política. Por isso ela critica aqueles que tendem a relegar o espaço da fé à vida pessoal ou familiar, excluindo a ordem profissional, econômica, social e política, como se o pecado, o amor, a oração e o perdão não tivessem importância aí” (Puebla, 515).
É preciso que se entenda política como a arte de fazer o bem comum, meio excelente para os cristãos praticarem a caridade que nos foi ensinada por Cristo Jesus. “Pois a comunidade política existe por causa daquele bem comum: nela obtém sua plena justificação e sentido, de onde deriva o seu direito primordial e próprio. Ora, o bem comum compreende o conjunto daquelas condições de vida social, que permitam aos homens, às famílias e às sociedades conseguir mais fácil e desembaraçadamente a própria perfeição” (Gaudium et Spes, 76). Parece estranho, mas a Igreja ensina que a vivência correta da vida política ajuda os cristãos em geral a viverem mais perfeitamente e assim alcançar a santidade.
Talvez você esteja pensando: “Mas na política só tem ladrão! Eu não vou me juntar com aqueles desonestos!!!” Isso continua a acontecer porque você, que se diz honesto e justo, ainda não teve a ousadia de doar os seus melhores frutos no serviço do bem comum. Se a vida política do nosso país é assaltada por pessoas mal intencionadas, não é porque a política seja suja por si mesma, mas porque os que são realmente bem intencionados e capacitados para o bem comum não se dispõem a empenhar suas vidas nessa nobre causa.
O livro dos Juízes conta uma história: “As árvores se tinham posto a caminho para ungir aquele que seria o seu rei. Disseram à oliveira: ‘Reina sobre nós’. A oliveira lhes disse: ‘Renunciarei a meu óleo, que deuses e homens em mim apreciam, para ir agitar-me acima das árvores?’ As árvores disseram à figueira: ‘Vem tu reinar sobre nós’. A figueira lhes disse: ‘Renunciarei a minha doçura e a meu bom fruto para ir agitar-me sobre as árvores?’ Então as árvores disseram à vinha: ‘Vem tu reinar sobre nós’. A vinha lhes disse: ‘Renunciarei a meu vinho, que alegra os deuses e os homens, para agitar-me sobre as árvores?’ Então as árvores disseram ao espinheiro: ‘Vem tu reinar sobre nós’. Mas o espinheiro disse às árvores: ‘Se é com lealdade que me dais a unção para que eu seja vosso rei, então vinde abrigar-vos sob a minha sombra. Mas se não for assim, um fogo sairá do espinheiro e devorará os cedros do Líbano” (Jz 9,7-15).
Hoje nos vemos sendo governados por vários espinheiros, árvores que não têm sombra e ainda apresentam múltiplos espinhos. Gostaria de perguntar: “Até quando ficaremos imobilizados, negando os nossos melhores frutos para Deus e para os nossos irmãos?”.
“A Igreja considera digno de louvor e consideração o trabalho daqueles que se dedicam ao bem da coisa pública a serviço dos homens e assumem os trabalhos desse cargo” (GS, 75) e ainda: “Os que são idôneos ou possam tornar-se para exercer a difícil e, ao mesmo tempo, nobilíssima arte política, preparem-se para ela e procurem exercê-la, esquecidos do proveito próprio e de vantagens materiais. Pela integridade e com prudência, lutem contra a injustiça e a opressão ou o absolutismo e a intolerância, seja dum homem ou dum partido político; dediquem-se, porém, ao bem de todos com sinceridade e retidão, bem mais, com o amor e a coragem exigidos pela vida política” (GS, 75).
O próprio Jesus nos deu o exemplo. A atitude profética de Jesus, em defesa dos pobres e dos oprimidos, devido a seu radical compromisso com a vida, teve profundas repercussões políticas. Ele chamou Herodes de “raposa” (cf. Lc 13,22), ironizou os opressores que se intitulavam “benfeitores do povo” (cf. Lc 22,25), criticou o luxo das autoridades (cf. Mt 11,8) e a opulência dos ricos (cf. Lc 6,24; 16,19-31; Mt 6,24), negou o caráter divino do poder de César (cf. Mt 22,21). Por isso, Ele foi acusado injustamente de subverter a ordem pública (cf. Lc 23,2.5), de conspirar para ser o rei dos judeus (cf. Jo 19,19) e por esse crime foi condenado (cf. Jo 19,12-16). “O Reino de Deus proclamado por Jesus, conquanto não se reduza à política, possui uma dimensão política. Porque importa na modificação global e estrutural dos fundamentos da velha ordem. Esta transformação é condição para o mundo pertencer ao Reino de Deus” (CNBB, Igreja e política, 15). Da mesma forma que Jesus, precisamos crer e agir. O crer que não corresponde a uma atitude concreta em relação aos irmãos, ainda não é a verdadeira fé.
A maioria de nós, certamente, está muito distante de candidatar-se a um cargo político. Porém, graças a Deus, vivemos em uma sociedade democrática e você pode fazer muita diferença votando na pessoa certa. É preciso entender que cada voto faz diferença e mesmo que não exista um candidato que se identifique com a proposta cristã, um deles irá governar o nosso país e também governará a você. É importante, então, votar no melhor ou no menos ruim, mas nunca anular o voto ou votar em branco. Creia, você faz diferença e, se cada cristão se conscientizar disso, faremos todos juntos a diferença significativa para mudar este país e conformá-lo com a vontade de Deus.
Gostaria de clamar ao Senhor que nos dê a fé, o entendimento e a ação para que possamos mudar a face da terra. Que a política seja para todos os cristãos uma constante e uma forma apaixonada de nos dar a Jesus nos irmãos, mesmo que isso nos custe a perseguição, a má fama e até o martírio. É na união das realidades do céu e da terra que podemos provar a nossa adesão ao mandato de Jesus de amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a nós mesmos. Quando fazemos um ato que atinge toda a coletividade e não somente a nós, expressamos a nossa fé na criação do Reino de Deus aqui na terra e provamos o nosso despojamento em relação à mentalidade egoísta que reina em nosso meio. Mesmo que você nunca venha a ser um candidato a um cargo político, que seu voto possa ser um ato consciente de buscar sempre o melhor candidato e o bem para todo o povo de Deus e não simplesmente uma obrigação perante o governo que você cumpre para não ser prejudicado. Que Ele nos dê o entendimento correto das realidades celestes que fazem diferença na terra.